Por Fabíola Maria Pereira Bezerra
Os sistemas de classificação existentes oferecem um “imenso mapa do
conhecimento”, formando um arcabouço, em que as ideias podem
articular-se, umas com as outras, de diversas maneiras. A proposta aqui
não é questionar os sistemas de classificação existentes, muito pelo
contrário, acredito que eles respondem, de forma eficiente, ao objetivo
para o qual foram criados. O ponto que gostaria de abordar é em relação à
dificuldade de compreensão, por parte dos usuários, dessa simbologia
utilizada nas bibliotecas no processo de representação do conhecimento.
Durante nove longos anos, estive à frente dos treinamentos para usuários
de biblioteca universitária. Foi um período onde pude conhecer mais
detalhadamente a visão deles sobre bibliotecas e sobre bibliotecários.
Um dos grandes GARGALOS de comunicação que identifiquei foi em relação à compreensão organizacional adotada pela biblioteca para guarda dos
livros nas estantes, tornando-se, algumas vezes, um grande labirinto de
difícil locomoção.
Observo que a preocupação por parte de
bibliotecários consiste em seguir “cegamente” as regras e padrões de
tratamento da informação, ignorando que os usuários não sabem a
utilidade destas regras e muito menos o que elas significam. Nesse
sentido, acredito que o grande desafio do profissional da informação
será sua postura em não se limitar a dominar a técnica de manuseio e
compreensão dos complexos códigos de classificação e catalogação, mas
sim a transmissão e decodificação destes em uma linguagem mais próxima à
de sua clientela, criando fórmulas de simplificação, assumindo seu
papel de “facilitador”, mediador entre usuários e sistema de recuperação
da informação. A compreensão truncada do processo de tradução pelos
usuários é consequência da ausência de sentido da simbologia
alfanumérica, utilizada pelas linguagens de classificação.
NA MAIORIA DAS VEZES, o que é óbvio para o bibliotecário não é evidente
para o usuário. Baseados neste princípio é que muitos sistemas de
informação são sub-utilizados pelos seus usuários potenciais.
Gostaria de ilustrar a minha fala apresentando rapidamente como exemplo
o resultado da minha pesquisa de Mestrado, que tratou sobre a
representação nos sistemas de informação. O universo pesquisado foram
600 usuários de duas bibliotecas universitárias e uma biblioteca
pública.
Dentre outras questões, procuramos conhecer o nível de
compreensão que os mesmos possuem em relação ao sistema de
classificação, materializado nas etiquetas dos livros. Do universo
pesquisado, somente 10 usuários associam a classificação ao assunto do
livro. Quando observamos as respostas apresentadas pelos usuários que
assumidamente reconheceram não entender o significado dos números é que
fica evidente o quanto nosso sistema de representação tem pouco
significado para eles:
“É um código estranho e inacessível ao utilizador comum”;
“Se é possível ou não 'levar para casa';
“Se é possível ou não 'levar para casa';
“Não entendo a etiqueta na estante, há sempre um funcionário para auxiliar”;
“Sei que são números através dos quais a biblioteca vê quantos
exemplares e que livros tem, mas para mim isso não interessa”;
“Frequento esta biblioteca há 4 anos e ainda não consegui entender o modo de organização dos livros”;
“Para mim não tem significado, mas acredito que para os bibliotecários deve ter”;
“Essas etiquetas referem-se apenas ao local da estante a que o livro
pertence. Essa informação é apenas útil para quem vai arrumar a
estante”;
“Não sei ao que se referem, talvez para regulamento interno, não é relevante”;
“Porque nunca perdi tempo a analisar essas etiquetas, é porque
compreendo que fazem parte do sistema de informação da biblioteca e, por conseguinte, não necessariamente perceptível aos leitores”;
“Penso
que deve ser um código adotado pela biblioteca, que tem sentido para
eles que o designaram e não para nós que utilizamos”;
“Apesar de
não serem de grande utilidade para os leitores, têm grande importância
para a organização dos livros por seções (e para todo o tratamento
bibliotecário, facilitando posteriormente a aquisição dos livros”;
“São apenas um código para identificação dos livros, sem interesse para o usuário”;
“Para identificação do patrimônio”;
“Apenas sei que os livros estão organizados por ordem alfabética de autor”;
“Raramente consigo identificar o código com os livros, para mim trata-se apenas de um código do livro”;
“Porque haveria de ter?”;
“Provavelmente terá relação com os temas e ordem cronológica de aquisição”;
“Ano de publicação e autor”;
“Sim, às vezes, nunca me explicaram a lógica”;
“Basicamente a única coisa que uso das etiquetas é o nome do autor, que é
fácil encontrar alfabeticamente, já que está tudo organizado por temas. O resto, não entendo”;
“Não percebo qual é a lógica da numeração”;
“Tem muitos algarismos dispostos sem ordem aparente”;
“Não gosto de perder tempo a procurar livros, logo as etiquetas nada me dizem. Prefiro pedir ajuda”;
“É utilizado um código pouco intuitivo”;
“Os números não têm significado porque não são de fácil compreensão”;
“Entendo que tenha significado para os técnicos”;
“Se não fossem os auxiliares, não encontrava nada”.
Não defendo a tese de que os usuários de bibliotecas precisam aprender a
classificar livros, ou mesmo saber manusear os complexos códigos de
classificação. Meu questionamento limita-se à compreensão dos usuários
em relação à estrutura (ou ideia) utilizada na composição dos números na
etiqueta dos livros. É desanimador enquanto profissional perceber que
usuários de bibliotecas não associam os números aos assuntos, ou mesmo
não compreendem que a organização da biblioteca segue uma estrutura
lógica baseada na divisão do conhecimento; para eles, os números são
simplesmente uma forma de codificação de localização que permite à
biblioteca vir a saber onde cada livro está. Se houvesse por parte deles
uma compreensão, por menor que fosse, certamente o processo de
recuperação da informação seria muito mais eficiente, e a interface
biblioteca vs usuário muito mais amigável.
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